Os chamados black blocs são conhecidos em vários países por esconder o rosto e atacar símbolos de um Estado que julgam opressor.
São algo entre o Zorro e Robin Hood. Mascarados contra o sistema, com
métodos de cowboy fora-da-lei. Heróis ou vilões, em defesa dos fracos e
oprimidos.
Porém ao contrário dos personagens da ficção, não são considerados
como indivíduos e sim como grupos de pessoas autônomas e anônimas.
Milhares de pessoas sem um comando central, representantes, ou mesmo
qualquer estrutura hierárquica. Unidas pelo momento histórico.
Grupos, bandos ou quadrilhas, dependendo do viés ideológico de quem
os define. Indíviduos livres a se manifestar como quiserem e em seguida
desaparecer na multidão.
Os conflitos com a polícia se tornam inevitáveis, uma vez que os
interesses do Estado são muitas vezes diretamente contrários aos dos
manifestantes. O Estado trata de manter uma ordem estabelecida, que é
justamente o alvo das ações.
Ao expulsar sem-tetos de prédios privados abandonados ou dispersar
manifestantes com gás de pimenta e balas de borracha, a polícia cumpre o
que manda a lei. No caso, a vontade do Estado, e é isso o que os black
blocs colocam em questão. Até que ponto a vontade do Estado é legítima
e, de fato, democrática.
No Brasil, desde o início das grandes manifestações em junho do ano
passado, esses conflitos já deixaram muitos feridos e outros tantos
mortos. A opinião pública se voltou contra os black blocs e as leis
antiprotestos ficaram mais rígidas para a Copa do Mundo. Prender ficou
muito mais fácil.
Em São Paulo, Fábio Hideki Harano e Rafael Lusvarghi não portavam
explosivos, afirmou laudo técnico do Gate (grupo antibombas da PM) e do
Instituto de Criminalística, mas ficaram presos por 45 dias. O juíz
responsável pelo caso, Marcelo Matias Pereira, queria mais.
Segundo ele, porque ainda que sem explosivos Fábio e Rafael utilizam
de outros meios para “atentar contra os poderes constituídos e
desrespeitar as leis e os policiais”. Na sequência, o magistrado os
acusa de usarem tênis Nike e ainda assim combater o capitalismo,
chama-os de “esquerda caviar”.
Acabou por libertá-los, mas a semelhança do seu texto com o de blogueiros da VEJA continua assustadora.
Já no Rio de Janeiro, o filósofo russo Bakunin escapou de ser
enquadrado como black bloc violento com o álibi de estar morto desde
1876.
Minha professora de Filosofia, Camila Jourdan, porém, foi parar na
cadeia, junto com outros tantos, também supostos black blocks violentos,
que eu não conheço. Ou “conheço” pela mídia. E pela mídia eles parecem
fabricados.
Lembro uma capa da revista Época que há alguns meses apresentou uma
suposta black bloc perdida e confusa, de quem ninguém nunca mais ouviu
falar. Já a VEJA estampou uma entrevista de várias páginas com uma
suposta liderança surgida nas ruas, criada à imagem e semelhança da
própria revista.
Do inquérito que prendeu a minha professora por treze dias e que
acusa Bakunin, conhecemos principalmente as gravações telefônicas,
divulgadas em primeira mão pela Globo, antes mesmo de chegarem ao
desembargador (os meios da Rede Globo são realmente fantásticos!) que
libertou os ativistas.
Já do caso de São Paulo, sabíamos que Fábio e Rafael portavam
materiais explosivos, que, na verdade, não eram nem mesmo inflamáveis.
Passaram 45 dias na penitenciária de Tremembé.
Mas e se, de fato, foram muitas outras as acusações equivocadas e os presos inocentes?
Pedidos de desculpa parecem pouco e o mínimo que podemos fazer no
momento, é ouvi-los. Tentar conhecê-los, antes de colocá-los todos num
mesmo saco e começar a bater.
Conversei com a professora Camila recentemente e ela me disse que
considera o inquérito literatura fantástica de má qualidade, que as
gravações são “devassadas” e “descontextualizadas” e só foi presa para
servir de exemplo.
Nas palavras dela: “… o que eles fingem não saber é que o problema
não sou eu, não é a Elisa(Sininho), não são os demais presos e
perseguidos, o problema é todo um contexto histórico.
Mas eles não podem
prender e criminalizar todas estas pessoas, por isso é tão importante
focar em alguns, fabricar líderes.”( a entrevista na íntegra está
publicada no DCM)
Eu gostava muito das aulas da Camila, principalmente sobre Lógica.
Caso fique provado que prendê-la foi um absurdo, seus alunos também
deveriam ser indenizados.
Diário do Centro do Mundo
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