O Pará está de joelhos, encolhido e
aterrorizado pela violência. Sair às ruas, seja de dia ou à noite, é um
risco permanente.
O problema não é sair de casa, mas saber se retorna
sem ter sido admoestado por um malfeitor. A insegurança está por toda
parte: na viela escura do subúrbio, na praça do centro da cidade ou num
sinal de trânsito, na feira, no jogo de futebol, na porta da escola, na
parada de ônibus.
O terror da noite passada, com a matança
promovida por agentes da lei que deveriam zelar pela segurança dos que
pagam seus salários– as autoridades responsáveis pela investigação das
mortes não admitem oficialmente o que já sabem – é o retrato de uma
Belém sitiada pela banalidade do crime.
Já era previsível que, a qualquer hora,
viesse à tona o que se comentava sobre a participação de militares da
Rotam em um grupo de extermínio. Que, aliás, botou suas garras de fora
depois que um integrante da própria corporação, licenciado para
tratamento de saúde e também por responder a inquéritos por homicídio,
ser morto a tiros por pistoleiros ligados ao tráfico de drogas. A morte
do policial desencadeou uma revolta entre os colegas.
“Vá com deus, irmão! O sr combateu um
bom combate e cumpriu a sua missão. CB Pety (como era conhecido Marco
Figueiredo). A caça começou...!!! Te liga vagabundo... a Rotam esta com
sangue nos olhos”, foi a mensagem postada na página da Rotam na
Internet. Uma página que, em nota, a assessoria do governo do Estado
disse não reconhecer. De qualquer maneira, a página tinha até ontem mais
de 10 mil curtidas e vários comentários de incentivo à vingança.
Os que saíram em campo movidos pela
fúria vingativa e armados com pistolas ponto 40, além de outros tipos de
armas, decidiram que seria melhor fazer logo a chamada justiça com as
próprias mãos, em vez de aguardar que a Polícia Civil, o Ministério
Público e a Justiça fizessem seu papel de investigar, denunciar e julgar
os matadores do militar. Com essa atitude, os justiceiros acabaram por
revelar que não há comando na tropa, ou que este é frágil e incapaz de
impedir que se manche, com atitude insana, todo um trabalho feito pela
maioria dos policiais militares que diariamente expõem suas vidas em
defesa da sociedade.
O promotor militar Armando Brasil
Teixeira, que tem sido duro no combate aos desvios de conduta, informou
que está acompanhando todo o trabalho de investigação policial e que não
hesitará em pedir a condenação a pena máxima e expulsão da tropa em
caso de confirmação do envolvimento de policiais militares. Brasil
também pediu que a população de Belém não se deixasse influenciar por
informações exageradas.
“A população não deve entrar em pânico. Há
muitas pessoas se aproveitando da situação e espalhando boatos pela
internet, tentando criar uma situação de caos”, afirmou o promotor. O
secretário de Segurança Pública, Luís Fernandes, comentou que, pelo
menos, seis das noves vítimas apresentavam característica de execução.
Ele confirmou que as mortes não ocorreram em confronto com a polícia e
que não houve mortes durante a operação para localizar os assassinos do
PM. A Corregedoria da Polícia Militar disse que não descarta e nem
confirma a participação de membros da PM nesses crimes.
LIMPEZA
LIMPEZA
Mas se a polícia e as autoridades da
segurança ainda não se arriscam a apontar os responsáveis pela matança,
testemunhas dão pistas valiosas. Um parente de uma das vítimas disse que
os homens estavam vestidos de preto, usavam capuzes e estavam em várias
motocicletas, seguidos por carros também de cor preta. Outro, revelou
que militares apareceram em várias ruas da Terra Firme intimando os
moradores para se trancassem em suas casas, porque a “limpeza” ia
começar no bairro. O recado era claro: por “limpeza”, eles queriam se
referir a pessoas pobres, negras e que tivessem envolvimento com a
bandidagem. Uma “limpeza”social.
Corriam, é lógico, o grande risco de
sair matando inocentes. A cantora Gaby Amarantos postou em sua página
nas redes sociais o seguinte, referindo-se a uma das vítimas, do bairro
do Jurunas: “o rapaz de boné branco era homossexual, e era conhecido
pelo apelido de “Carequinha”.
Ele estava comemorando seu aniversário
quando foi abordado e confundido com um bandido, inocente e sem
antecedentes”. Amarantos pediu que as autoridades cumpram seu papel e
“nos deem segurança”. “Não se trata de defender o crime ou criminalizar o
defensor, mais sim de me manifestar diante de um ato deplorável”,
resumiu a cantora.
Enquanto Gaby Amarantos e tantos outros
milhões de paraenses pedem paz, o delegado Eder Mauro, recém consagrado
nas urnas com mais de 150 mil votos para deputado federal, apaga o
incêndio da matança com mais gasolina: num vídeo postado ontem à tarde
por ele no Facebook, Mauro aparece no gramado do Congresso Nacional, em
Brasília, prometendo que estará hoje em Belém para um acerto de contas
“com a bandidagem”, desafiando-a para o confronto. É, como se vê, um
recado de dar medo.
(Diário do Pará)
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