Entre
paredes com mofo e infiltrações e crianças internadas pelos corredores do
Hospital Estadual de Santana, uma cena chama a atenção: uma recém-nascida, de
apenas 900 gramas, é mantida viva com ajuda de uma incubadora improvisada de
recipiente plástico na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal.
A cena é
o retrato do que os profissionais do hospital fazem para tentar manter a saúde
de prematuros e outras crianças com os recursos que têm disponíveis. O Governo
do Estado do Amapá (GEA) afirma que investe em reformas estruturais e que
demanda reforço de profissionais.
O
flagrante foi feito durante uma vistoria dos conselhos regionais de Medicina
(CRM) e de Enfermagem (Coren) do Amapá, na sexta-feira (26). Na fiscalização,
as entidades identificaram mais de 80 irregularidades na unidade de saúde que
funciona da região central do município que fica a 17 quilômetros de
Macapá.
Na UTI
neonatal do hospital, cinco bebês precisam de incubadora, mas só uma estava em
pleno funcionamento na sexta-feira. Para tentar salvar as crianças, os médicos
improvisam para garantir a respiração e temperatura dos bebês.
“O número
de leitos é insuficiente. […] Isso é uma gambiarra. É muito frequente
profissionais da saúde fazerem isso para a gente poder dar uma chance de vida
àquele prematuro. Essas crianças precisam de atenção, precisam manter a
temperatura, e sem isso, compromete o tratamento”, relata o presidente do CRM
no Amapá, Eduardo Monteiro.
O
Hospital Estadual de Santana é uma unidade que possui setores para atendimentos
de urgência e emergência (pronto-socorro), laboratório, UTI e semi-intensiva
adulto, UTI neonatal, e enfermarias adulto e infantil.
Além da
situação do setor que atende as crianças prematuras, a vistoria apontou
infiltrações, paredes com mofo, fiações elétricas expostas, folhas de
compensado no lugar de janelas, torneiras danificadas, aparelhos quebrados e
falta de remédios, equipamentos e de profissionais, entre outros.
Na
pediatria, o setor com mais irregularidades, há superlotação com falta de
leitos; e dois médicos e uma equipe reduzida de enfermeiros e técnicos que
atendem, em média, 250 crianças no período de 24 horas.
“É ruim a
situação. Não só pra mim, mas para todas as mães que estão aqui”, comentou a
dona de casa Selma Viegas, que acompanhava o filho no hospital.
Por falta
de leitos na enfermaria, 44 pacientes eram atendidos em cadeiras improvisadas e
bancos de madeira pelos corredores na sexta-feira.
“Eu
passei a noite com a criança no colo. Quem vai conseguir dormir num pau desses?
Tá vendo como está esse banco? Tá horrível o banco, né? E a criança tem que
ficar no banco”, relatou a diarista Railane Martins.
Problema
dividido com a dona de casa Ariane Ribeiro, que está há dias com o filho de 11
meses internado com pneumonia.
“É muito
ruim. É péssimo. Porque tem muita gente, muita criança aqui, muitas bactérias
circulando aqui, aí meu filho pode contrair uma outra doença, além da que ele
tem”, reclamou.
Enquanto
os corredores estão lotados de crianças, o laboratório da unidade está quase
vazio. Com equipamentos em falta, uma funcionária não identificada conta como
os materiais descartáveis são reaproveitados.
“Esses
aqui são os tubos de hemograma. A gente lava. Despreza o sangue e lava. Esse
aqui tudo bem, que vai na estufa. Mas os coletores de urina, esses aqui, só são
lavados com água sanitária e sabão porque eles não vão para a estufa porque são
plástico. É reaproveitado. Não tem. O que a gente pode fazer?”, detalhou.
Os
problemas, segundo o CRM, são consequências da falta de estrutura, de
equipamentos e de pessoal, o que arrisca a vida dos pacientes que precisam do
serviço. Ele cita que o município já deveria ter um hospital infantil.
“Não eram
leitos, eram cadeiras, bancos, macas. É uma preocupação grande porque quando se
tem um número grande de pacientes a serem internados com número insuficiente de
profissionais, a probabilidade de cometer algum equívoco é muito grande, assim
como proliferação de doenças”, ressaltou o presidente só CRM.
Os
conselhos informaram que encaminhariam o relatório com os apontamentos ao
governo do Estado na segunda-feira (29). O texto também será enviado ao
Ministério Público do Amapá (MP-AP) e ao Ministério Público Federal (MPF) para
que tomem medidas judiciais.
Enquanto
a situação não melhora, a dona de casa Divina Silva Santos, que divide um banco
com duas crianças internadas, lamenta a situação.
“Com essa
quantidade de crianças doente é difícil a situação. A gente tem que ficar no
corredor. Tem muita gente no corredor de um lado para o outro. Está bem difícil
a situação. Criança chegando a todo momento. Não sai. Só chega, chega”,
lembrou.
O que diz
o governo?
A
Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) informou, em nota, que até o início da
tarde de segunda-feira, ainda não havia recebido o relatório referente à
inspeção no Hospital Estadual de Santana.
O
documento também afirma que a Sesa, dentro da capacidade financeira
orçamentária, tem realizado readequações como a reforma de setores da unidade,
reforço de servidores de enfermagem, reabilitação e administrativo, além da
aquisição de mobília e equipamentos hospitalares.
A Sesa
reforçou ainda que não tem medido esforços para manter a qualidade e celeridade
na prestação dos serviços que são indispensáveis para a população.
A pasta
reitera, porém, que as Unidades Básicas de Saúde (UBSs) - de responsabilidade
da prefeitura – são os locais responsáveis pelos atendimentos primários de
menor complexidade.
As
demandas da atenção básica representam mais de 60% dos atendimentos do Hospital
de Santana, o que compromete a assistência de urgência e emergência, lembrou a
Sesa.
Fonte: G-1 Amapá
Nenhum comentário:
Postar um comentário