As discussões
para estabelecer uma estratégia contra o comércio ilegal de seres
humanos no Estado o Amapá.
Os debates iniciaram na manhã desta segunda-feira,
27, com a abertura oficial da Semana Nacional de Enfrentamento ao
Tráfico de Pessoas.
As atividades fazem parte da Campanha
Coração Azul, que é mobilizada em todo país pelo Ministério da Justiça
(MJ) e visa sensibilizar e aumentar a participação da sociedade, e
entidades públicas e privadas contra este tipo de crime.
O evento ocorreu no auditório da Secretaria de Estado da Justiça e
Segurança Pública (Sejusp), onde se reuniram representantes da sociedade
civil e da Secretaria Extraordinária de Política para as Mulheres
(SEPM), e dos Centros de Referência em Atendimento à Mulher e à Família
(Camuf) e à Mulher (Cram), além da Coordenadoria de Segurança
Comunitária (CSC) da Sejusp.
A programação segue até a próxima
quinta-feira, 30, Dia Mundial de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. A
data foi instituída em 2013 pela Organização das Nações Unidas (ONU).
O secretário de Justiça e Segurança
Pública, Gastão Calandrini, enfatizou a importância do evento ao lembrar
que os 16 casos identificados no Estado nos últimos três anos colocam o
Amapá nas rotas interestadual e internacional do comércio criminoso de
seres humanos.
Ele exemplificou ao citar duas situações registradas pelo
Núcleo de Enfretamento ao Tráfico de Pessoas (NETP) da Sejusp neste
período.
No primeiro caso, ocorrido em 2014, em
Macapá, um idoso de 70 anos foi preso no canal das Pedrinhas quando já
embarcava para o interior paraense levando uma criança de nove anos de
idade que ele havia comprado por R$ 6 mil. O aliciador conseguiu
escapar.
Já no outro caso, também em 2014, uma
jovem colombiana foi aliciada por traficantes haitianos na capital
paulista sob a falsa promessa de um salário atrativo para trabalhar como
empregada doméstica em casas de família na Guiana Francesa. A vítima
teve a sorte de conseguir escapar e cruzou a fronteira de volta para o
lado brasileiro, onde ficou refugiada por três dias em uma igreja do
município de Oiapoque.
Ela revelou que na ida para o departamento
ultramarino francês passou pela capital amapaense, para onde foi
encaminhada após a fuga. À época, a estrangeira foi acolhida pela rede
de atendimento do NETP e enviada de volta a São Paulo.
"Esses crimes são quase invisíveis, mas
ocorrem. É uma realidade que devemos enfrentar. Por isso esta semana de
debates será um ponto de partida para estabelecer políticas consistentes
contra o tráfico de humanos nas nossas fronteiras, tanto internacionais
quanto com o Estado vizinho do Pará", reforçou Calandrini.
A secretária Extraordinária de Políticas
para as Mulheres, Silvanda Duarte, reforçou a necessidade de estratégias
específicas para a fronteira com as Guianas (francesa e holandesa).
Segundo ela, o Estado está em conversação com a prefeitura de Oiapoque
para a cessão de um terreno, que abrigará a construção da sede de um
Centro de Fronteira. A repartição concentrará órgãos de defesa para
ações integradas contra esta modalidade de crime.
"Nós já estivemos este ano em Brasília,
onde tivemos uma resposta positiva quanto ao apoio para a construção do
Centro com sede própria. Este órgão funcionava, até o ano passado, em
uma sala de uma delegacia do município. Não é o ideal, mas nós já
estamos discutindo os passos para a reativação do Centro", informou a
secretária.
Capacitação
Após os pronunciamentos, a assistente
social da Sejusp, Christine Fonseca, especializada pelo Ministério da
Justiça em enfrentamento ao tráfico humano, palestrou sobre o tema. Foi o
início das capacitações previstas na programação da Campanha Coração
Azul no Amapá.
Durante a palestra, ela apresentou estudos
que apontam o Amapá como passagem, destino e origem do comércio ilegal
de pessoas. Um levantamento da ONU mostra a Região Norte brasileira com
maior número de rotas interestaduais de tráfico de seres humanos. Foram
76 identificadas pelas autoridades brasileiras. A Região Nordeste vem em
segundo, com 52 rotas.
O livro "Mulheres e homens trabalhando
pala paz e contra o tráfico de mulheres e a violência sexual", publicado
este ano, traz o Amapá com 52 possíveis portas de entrada e saída para
estas organizações criminosas.
Realizada entre os anos de 2013 e 2014, a
pesquisa das autoras Vera Vieira e Clara Charf, respectivamente
professora doutora da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da
ONG Associação Mulheres pela Paz, abrangeu nove regiões fronteiriças do
país, entre elas o Amapá. A publicação reservou um capítulo para falar
sobre o tema "Macapá, a vulnerabilidade das fronteiras com o Suriname e
Guiana Francesa".
Christine Fonseca lembrou que não é apenas
para a exploração sexual que crianças, adolescentes e adultos são
aliciados. Há ainda outras destinações do comércio ilegal de seres
humanos, como a remoção de órgãos e tecidos e a adoção ilegal de
crianças. Ela também revelou que mães solteiras são um dos principais
alvos, porque estão em situação de vulnerabilidade e querem sustentar os
filhos.
A assistente social também apresentou um
mapa mundial do tráfico, que coloca o Brasil como o maior exportador
ilegal de órgãos humanos. Segundo o estudo, também da ONU, além de
Estados Unidos e Israel, é nos países da Europa que são realizadas as
cirurgias ilegais clandestinas para retirada dos órgãos.
Projeto de Lei
O Brasil não tem uma legislação específica
para tratar deste tipo de crime. Todos os registros são configurados em
outros artigos do Código Penal Brasileiro, como exploração sexual,
aliciamento e cárcere privado, entre outros. Tramita na Câmara dos
Deputados, o Projeto de Lei 7370/2014, que propõe a tipificação do crime
de tráfico humano no Brasil. A minuta traz uma pena para estes casos de
até 8 anos de prisão, além de multa.
"A aprovação deste projeto seria um grande
avanço para o país combater este crime. A motivação e a organização de
quem pratica o tráfico de pessoas, também reside na impunidade ou
sentença branda, em razão da falta de uma legislação específica",
ponderou o secretário Calandrini.
A programação continua nesta terça-feira,
28, às 9h, também na Sejusp, quando ocorre uma capacitação para agentes
do Cram, Camuf e Sejusp. O mini curso é voltado à rede de atendimento às
vítimas do tráfico de pessoas.
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